Como gestor de projetos de construção civil, você provavelmente já ouviu falar sobre compliance como importante política empresarial. Talvez não saiba ao certo o significado dela. Também pudera. A política de compliance está longe de ser algo simples e envolve atividades que não se resumem apenas ao combate à corrupção. Ela virou moda nos últimos tempos por causa do decreto 8.420/2015, que regulamentou diversos aspectos da Lei Anticorrupção (12.846/2013), um marco na história jurídica do Brasil por possibilitar finalmente que as empresas também sejam punidas por atos de corrupção.
Compliance é uma palavra em inglês que deriva do verbo “to comply” cujo significado consta no dicionário como “agir em sintonia com as regras”. Compliance, portanto, pode ser traduzido como a capacidade da empresa de estar em conformidade com as normas que regulam direta ou indiretamente seu negócio. Uma empresa que atua no Brasil deve obrigatoriamente seguir a legislação, seja ela trabalhista, seja ela tributária, seja ela ambiental. Caso estejamos falando de uma multinacional, deverá a matriz seguir as regras do país de origem e assegurar que as subsidiárias sigam também dos países onde estão sediadas.
A política empresarial de compliance não pode ser encarada pelos executivos, incluindo os de construção civil, como simples verificação de obediência às leis. Trata-se de algo muito maior, já que sua proposta é fazer com que todos os profissionais, incluindo os próprios diretores e fundadores das companhias, ajam com ética. O compliance quer afastar toda e qualquer relação entre organizações ou entre organizações e o governo que não esteja ancorada nos princípios da boa-fé e da honestidade. Uma das táticas usadas pelas empresas que se destacam nesse trabalho está na criação de um código de conduta. Ao estabelecer regras claras sobre o comportamento na condição de funcionário da empresa, não importando o posto que ocupe, esse código evidencia aquilo que se espera das pessoas.
Uma situação de suposto assédio sexual é de responsabilidade da equipe de compliance, que deve investigar internamente sua veracidade. Nesse caso, a denúncia deve chegar por meio do canal de comunicação mantido com esse propósito. O atendente deve estar preparado para confortar a denunciante, que afirma ter passado por um trauma, resguardando sua identidade. Em um segundo momento, a própria empresa deve ser capaz de investigar se o assédio ocorreu ou está ocorrendo. Conduzir um caso como esse da melhor forma significa garantir um ambiente justo e assegurar que a empresa não terá prejuízo em um processo trabalhista futuro.
Compliance também está no estudo da contabilidade. O acompanhamento dos números deve ser diário. As fraudes contábeis e fiscais são comuns e podem levar a empresa para a falência. Caso famoso foi a companhia de energia americana Enron, que pediu concordata em dezembro de 2001 com uma dívida de 13 bilhões de dólares. O fato de estar na Bolsa de Valores, recebendo obrigatoriamente auditorias externas frequentes sobre suas contas, não adiantou, pois as investigações apontaram participação dos próprios auditores.
Outra situação própria do compliance está na análise constante dos riscos ambientais oferecidos por cada negócio. Empresas de alimentos, por exemplo, avaliam como seus fornecedores estão tratando os animais. Algumas estão trocando seus parceiros porque eles insistem em criar os animais confinados, realidade cruel para os bichos que está sendo abandonada aos poucos graças à opinião pública. Verificam também as condições de higiene dos locais de abate. Já empresas de construção civil analisam como impactar o menos possível o meio ambiente em uma obra de infraestrutura.
Por falar em fornecedor, o compliance tem condições de pesquisá-lo em detalhes. Diariamente, as empresas fazem negócios com outras. O problema é que não verificam adequadamente a reputação dos parceiros. Por meio de uma investigação chamada due diligence, o fornecedor é minuciosamente analisado para que seja possível identificar ilegalidades. Um questionário encaminhado para o parceiro faz parte desse trabalho. As respostas são devidamente checadas pelos profissionais de compliance, que podem encontrar relação entre o dono da empresa e algum partido político, por exemplo. Em época de Operação Lava Jato, todo cuidado é pouco na hora de fechar negócios, especialmente na construção civil.
Ainda que a preocupação de respeitar as regras seja com todas as áreas do negócio, assegurando assim a preservação da imagem de marca e evitando processos, os profissionais envolvidos com compliance têm como prioridade fazer com que nenhum funcionário, membro da diretoria ou o próprio fundador se envolva com corrupção. Caso a equipe de compliance tenha autonomia real para trabalhar, até mesmo o presidente ou fundador da empresa pode ser afastado e devidamente responsabilizado em uma investigação interna. Observa-se ainda que auditorias externas são realizadas com frequência para assegurar que nenhum problema esteja passando despercebido pelos profissionais envolvidos com a política empresarial de compliance.
Esse trabalho todo de fiscalização começou ou se intensificou a partir do decreto 8.420/2015, que regulamentou aspectos da Lei Anticorrupção (12.846/2013) como critérios para o cálculo da multa, parâmetros para avaliação dos programas de compliance, regras para a celebração de acordo de leniência e disposições sobre os cadastros nacionais de empresas punidas.
Em caso de condenação da empresa, a multa pode chegar a 20% do faturamento bruto anual. Não sendo possível utilizar o faturamento bruto da empresa, o valor da multa ficará entre R$ 6 mil e R$ 60 milhões. O texto da lei prevê a responsabilização objetiva nos âmbitos civil e administrativo de empresas que praticam atos lesivos contra a administração pública nacional ou estrangeira. Como a responsabilidade é objetiva, não há necessidade de comprovar culpa para que a pessoa jurídica seja penalizada.
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